"Quando sua realidade particular é desafiada, ela cede à verdade."

What if I say I'm not like the others?
What if I say Im not just another one of your plays?
What if I say I will never surrender?

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Monólogo

"-Já parou para pensar em porquê... não, o senhor provavelmente não fez isso.
Desculpe, não quis acusar-te. Mas me deixe terminar.
Você provavelmente não parou para pensar todas as vezes em que alguém te criticou e o senhor, automaticamente, sentiu-se apenas com raiva e frustrado, chateado com a pessoa, e em momento algum parou para pensar no que lhe foi dito, e no porque daquilo. E sim, eu sei que vai dizer que sim, que o senhor pensou, mas que a pessoa foi grossa, que não tinha o direito ou que não era verdade ou o jeito certo de falar. Todas essas coisas parecem, com o meu perdão, estúpidas senhor.

Prossigo por partes.
Primeiramente você não pensou, estava ocupado demais procurando os motivos para refutar aquilo, ao invés de pensar nos motivos daquela pessoa lhe dizer aquilo. Em segundo lugar, uma pessoa grossa não deixa de estar certa simplesmente por não agir conforme os preceitos da educação e fineza. Os argumentos dela não são menos válidos do que os de uma pessoa polida e, na verdade, são muitas vezes melhores por não se cobrirem com as várias vestes e máscaras que a educação imbui às suas frases. O mesmo vale para a maneira com que se fala; não é isso que interessa e sim o que se diz. Quanto ao direito do que se diz meu senhor, vivemos em um mundo de homens livres, e algum dia um escritor há de escrever que liberdade trata-se de fazer o que quer, e isso inclui dizer aos outros tudo que se quer dizer, e não ser barrado pelo que o ouvinte não quer ouvir. Talvez a frase seja melhor formulada num futuro, eu não tenho tal dom. O que percebo entre meus clientes e, como seu amigo espero poder lhe ser sincero, é que as pessoas pararam de escutar umas as outras, se é que um dia o fizeram.
Todos reclamam dos outros sem olhar para si mesmos, e quando falam aos outros o que esperam deles ou o que acham ser o melhor, são completamente ignorados, mesmo que não com rancor, mesmo que com afeto, mesmo assim ignoradas. Trata-se de ouvir atentamente, ao invés de soltar mil palavras a esmo e esperar que alguma delas esteja certa.
Não é sobre seguir cegamente, mas sobre pensar de fato. Não se ganha uma discussão pelo número de palavras ou pela complexidade das frases que se formula. Ser grandioso trata-se de compreender o que os outros dizem, amar cada palavra como uma forma de crescer, rasgar-se em mil pedaços com o mínimo ponto de exclamação de terceiros e atentar ao que precisa ser melhorado, e não ficar com raiva e empacar-se como uma criança chorona. Mas talvez eu tenha me excedido, meu senhor.


-Não tenha dúvidas de que o fez, meu caro. Não sou obrigado a ouvir o que ouvi de nosso amigo e agora ainda ter que ouvir de você todas essas besteiras. É um homem de inteligência elevada, mas eu sei o que fazer de minha vida e ao alto de tal idade como estou, saberia mais rapidamente que um relâmpago o que devo ou não fazer. Sou o que sou, não preciso pensar sobre isso e nem, onde já se viu, mudar pelas palavras de um idiota qualquer! Está tarde e eu preciso ir, as ruas estão cada vez mais perigosas com o tempo. Boa noite e obrigado pelo chá.

-Disponha, e boa noite - A porta se fecha à saída do velho médico - eu provavelmente me excedi na conversa e as palavras não entraram nos ouvidos certos. Porém talvez as paredes mudem a posição de suas tábuas e as cores de sua cobertura.


A noite caiu tranquilamente e a lua se fez valer, como se nada tivesse acontecido ou importasse, ignorando a conversa por completo. Bem dizem que a noite é uma criança e a lua é uma donzela, surda provavelmente."